O acaso tem sido um grande companheiro da carreira empresarial da arquiteta gaúcha Ana Cristina de Souza Gomes, 61 anos. Ao hospedar-se em um castelo que pertenceu ao imperador Carlos Magno, Ana Cristina ficou impressionada com a qualidade do piso de cor amarela que revestia um dos ambientes. Tanto que deixou o marido e os filhos no hotel e embarcou no dia seguinte para Valência (na costa sul da Espanha) para conversar com o fabricante. Saiu do encontro com um contrato de cessão de tecnologia, pela qual desembolsou US$ 150 mil.
Nascia ali a Solarium Revestimentos. Isso aconteceu em 1997, ano em que a economia brasileira vivia a pressão desencadeada pela crise asiática. Em vez de se deixar abater pelas dificuldades, a empresária resolveu apostar na inovação. Agora, ela conta os dias para a chegada ao Brasil do príncipe herdeiro de Dubai, sheik Hamdan bin Mohammed Al Malktoum. A comitiva será composta de executivos de grandes construtoras da região, dispostos a captar novos fornecedores.
E a empresa comandada por Ana Cristina figura na lista de possíveis parceiros – graças a um conhecido da família que dá aulas de jiu-jítsu ao príncipe e que, durante uma folga nos treinamentos, falou sobre a Solarium. “Será uma grande oportunidade de ampliar a visibilidade de nossos produtos em âmbito global”, destaca. Hoje, as exportações colaboram com uma fatia ínfima da receita anual estimada pelo setor em R$ 15 milhões, baseada no custo médio do metro quadrado. Ela não revela o real valor. Os artigos da grife estão nas bordas de piscinas na Grécia e em pisos e paredes de lojas e edifícios comerciais em Angola, onde chegaram pelas mãos da construtora Norberto Odebrecht.
Versatilidade: pisos da Solarium podem ser aplicados em parede e têm padrões que imitam madeira e até couro
Mas não são apenas os clientes de outros países que concentram as atenções da empresária. Ana Cristina também acaba de fechar importantes contratos por aqui. Caberá à Solarium fornecer o material para o revestimento que será usado na reforma das fachadas das 190 lojas da rede varejista Pão de Açúcar, em São Paulo. A Oi, operadora de telefonia, é outra empresa que utilizará produtos da Solarium. Para dar conta dessas encomendas, ela está negociando com fornecedores italianos a compra de máquinas para desenformar as placas cimentícias. Hoje, a fabricação é totalmente artesanal e essa etapa consome cerca de três horas por dia. Tempo precioso para quem pretende ganhar escala global. Com isso, será possível quase dobrar a capacidade das cinco unidades da Solarium, situadas em Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo. Juntas, elas fabricam 120 mil metros quadrados de pisos e revestimentos por mês.
O grande mérito de Ana Cristina foi enxergar o potencial desse produto especialmente no chamado mercado de produtos sustentáveis. As peças são feitas a partir de uma mistura de componentes reciclados, cimento branco e mármore moído, e não geram nenhum resíduo. “O consumo de energia é mínimo, já que elas não precisam ser secadas em alto-forno”, destaca a arquiteta, que ostenta no currículo o projeto do prédio da Biblioteca Pública de Birmingham (Inglaterra).
Outra sacada de Ana Cristina foi o uso desses pisos como base para “fachadas ventiladas” – sistema considerado ecológico, já que ajuda a dissipar o calor reduzindo a utilização do ar-condicionado. Ela também passou a utilizar formas com formatos diferenciados, feitas por designers, além de texturas inovadoras, que lembram a madeira e o couro. Para ganhar espaço no mercado, a empresária fez parcerias com arquitetos e paisagistas badalados, que incluíram os produtos da Solarium em prédios e butiques. “Hoje, minha maior vitrine é o sofisticado Shopping Cidade Jardim (em São Paulo). Lá, quase 80% do revestimento de pisos e paredes das lojas é da grife Solarium”, diz ela.
Matéria publicada na revista IstoÉ Dinheiro de 1º de julho de 2009